terça-feira, 22 de setembro de 2009

Só, no Dogão da Esquina

Márcio, 30 anos, técnico de informática. Cláudia, 32 anos, vendedora de loja. Ele liga para ela e a convida para comer fora. Diz que vai passar pelo trabalho dela lá pelas 19h. Ela sabe que eles vão comer no Dogão da Esquina. Tudo é sempre assim.

São 19h e eles se encontram. Ele parece ansioso e nervoso. Meio desatento, olha em volta. Pedem o cachorro-quente habitual e sentam em uma das mesinhas. Cláudia olha o sanduíche de Márcio:

— Nossa, veio com ervilha.
— Ah, é... Deixa pra lá.
— Mas você não odeia ervilha?
— Tanto faz.

Enquanto comem, Márcio continua agindo de modo peculiar. Comem os sanduíches em silêncio. Cláudia reclama que Márcio “tá muito quieto e esquisito”. Ele responde que não, que “só tava com fome”.

Ele parece tentar dizer alguma coisa. Ameaça começar várias vezes, mas sempre desiste. Cláudia olha intrigada, Márcio desembucha:

— Vou ter que viajar.
— Ele diz, parecendo tenso.
— Quando?
— Semana que vem.
— Vai pra onde? Vou também.
— Vou pra Quatis. Não dá pra você ir. É por causa do trabalho.
— Mas no tempo que você tiver uma folguinha a gente passeia. O que tem nesse lugar, Quatis?
— Na-nada. — Ele gagueja.
— Duvido. Alguma coisa tem que ter.
— É sério. Não tem NADA. — diz um pouco exaltado.
— Ah, mas eu fico com você. Vai ser ótimo!
— E o seu trabalho?
— Falo com a Tina — lembra dela, a gerente? — que ela me libera por um tempinho.
— Duvido. É comercio.
— Mas tá em baixa, lá. Ninguém compra nada ultimamente.
— Mas não posso pagar sua passagem.
— Tenho dinheiro. — diz Cláudia de forma enfática.
— Mas vou ficar ocupado.
— Não à noite. — ela insiste
— A noite toda. — ele diz de forma pouco convincente.
— Então tem o dia livre?
— Não. Vou ter que trabalhar... er... umas boas... hm... 16h por dia. — diz Márcio, cheio de incertezas.
— Mas tem 8h livres, então.
— Pra comer e dormir.
— Sem diversão você pira.
— Me divirto trabalhando.
— E eu fico sozinha?
— Só por um tempo.
— Quanto?
— Um pouco. — ele diz tentando desconversar.
— Mas quanto? — ela insiste.
— Não me falaram... — ele se esquiva.
— Márcio, QUANTO?! — ela diz irritada.

Nesse ponto, Márcio já estava agitado e nervoso. Interrompeu a conversa bruscamente e anunciou que ia na barraquinha pagar os cachorros-quentes. Cláudia ficou sentada esperando, pensativa e distraída. Quando se dá conta, 5 minutos tinham se passado. Olhou para trás para procurar Márcio, mas ele tinha sumido. Foi-se embora. Ela ficou só, abandonada no Dogão da Esquina.


texto por
Ana Flávia Andrade
Lorena Figueiredo
Pedro Raphael Paiva
Vinícius Fernandes


quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Fim de semana no Rio

Um texto um tanto antigo, mas que eu achei nos confins do computador e resolvi usar. Umas férias fora de hora no meio do semestre. Nada como falar de uma ida ao Rio de Janeiro uma semana antes de ir de novo.



Fim de semana no Rio. Me fez bem, muito bem. Parece que tô um pouco mais leve. Até perdi o senso de cronologia num fim de semana.

A. e B. me levaram por aventuras nesse Rio de Janeiro (que, aliás, continua lindo). Fui de tênis pra praia, B. me chamou de Sheldon, vi o mar, molhei o pé na água, andei na areia, senti a maresia, o Sol no rosto, tomei coco no calçadão com A. e B., fui atacada por pombos, mas A. achou que a atacada tinha sido ela e saiu gritando.

A. achou a Batcaverna e a gente ficou rindo e olhando pra cima igual duas fumadoras de orégano no meio do metrô. Fomos ao bar da Devassa encontrar L. e os holandeses malucos. Um dos holandeses malucos gritou com A. "Cala a boooocaaaa! Me deixa em paaaaaaz!". Ninguém fala assim com A. Ela ficou pasma, eu e B. rimos, rimos e rimos mais um pouco.

Deliberadamente dormi no cinema, A. e B. acharam isso um pouco indignante, mas cinemas são lugares excelentes pra se cochilar. A gente comeu um Subway ishpéartu, encheu a cara de frango no KFC, comeu casquinhas do McDonald's às 23h, no meio da rua, enquanto os holandeses malucos questionavam: "Mas você lambe ou chupa? Toma ou come?" Ante caras de espanto, especificaram o que pra eles tinha ficado óbvio: "Tô falando da casquinha. Você não tá com uma casquinha na mão? Do que mais eu posso tá falando?"

Fui na UERJ, esperar A. Estudei. Andei de elevadores superlotados na Universidade, de metrô num carro só para mulheres, de ônibus grátis pro shopping, de táxi superbarato por aí, a pé pelas ruas de Copacabana, princesinha do mar.

Dormi sentada no sofá da casa da A. vendo o jogo da Seleção, comecei a ver a reprise do jogo logo depois de ele acabar (logo depois mesmo. Terminou em um canal e começou no outro. Instantâneo assim.), mas dormi de novo. Desisti do futebol e mudei de canal. Coloquei no filme do Bob Esponja, mas isso distraiu A., que escrevia a conclusão de um trabalho importante.

Comi um blueberry muffin e tomei um Grande Caramel Frapuccino no Starbucks, depois comi um número três do McDonald's e deixei minha dieta pra outro dia.

Acordei na segunda-feira com o Hino Nacional tocando na escola que tem em frente à casa da A. Quando chegou a hora de ir embora naquela segunda-feira de Sol depois de um fim de semana de tempo questionável e céus quase cinzentos, achei golpe baixo que Rio de Janeiro estivesse tão maravilhoso.


quarta-feira, 2 de setembro de 2009

O conceito de -53ºC não faz sentido

Era uma linda tarde de Sol de fevereiro. 16h30, Winnipeg. Desci do ônibus e caminhei civilizadamente por alguns metros. De repente eu já andava pela rua o mais rápido que podia. Não estava atrasada, não tinha medo, não fugia de ninguém. Mas eu corria. E ao correr ouvia meus passos no chão não fazerem barulho de passos simples no chão. Não era o barulho seco de passos no concreto, não soavam macios como passos na grama. Mas soavam em alto volume. Rangiam como só passos na neve rangem.

Lágrimas escorriam dos meus olhos. Eu não chorava, não ria, mas meus olhos lacrimejavam. Tinha pensado antes de correr, porque dependendo de onde viesse o vento, correr poderia ser minha pior ação. O vento vinhas das minhas costas. Correria então, porque assim diminuiria a intensidade do vendaval gelado. Suspeitava que isso não fizesse sentido nenhum, mas a idéia de driblar as forças da natureza me fazia rir, então resolvi manter o plano e correr.

Ia correr do ponto de ônibus até minha casa. A distância era curta, no máximo uns 500 metros, mas aquele frio fazia tudo mais difícil. Naquela tarde o maldito vento subtraía 7ºC da já absurda temperatura de -46ºC. O conceito de -53ºC não fazia sentido. Só consegui pensar naquela música do Randy Bachman e do Neil Young, “Portage and Main fifty below”. Eu não estava bem em Portage and Main. Estava bem longe disso, all the way in Lindenwoods, mas a coisa do fifty below ainda fazia sentido.

Então eu corri. Lindenwood Dr. East, Farmingdale, Fairhaven, Westchester Drive, 290!

Quando digitava o código da garagem pensei que nunca mais ia parar de sentir aquele frio, mas quando entrei em casa vi que Syd e Tom assistiam um documentário sobre o calor no deserto do Saara e eu decidi que aquele parecia um bom dia pra tomar sorvete de creme com framboesas congeladas.

Frases Fora de Contexto #7

Eu adoro uma calcinha molhada!


- Taísa*, tentando debochar de uma manchete da Capricho que dizia: "Calcinha boa é calcinha seca."

* Nome fictício pra proteger a atrapalhada.