quinta-feira, 28 de maio de 2009

Desaforo fotográfico

Eu tinha prometido pra mim mesma que seria mais agradável com as pessoas, então vinha tentando exercitar o autocontrole e a compreensão com os menos favorecidos intelectualmente. Por algumas vezes quase larguei tudo. Tem horas que não dá pra ser agradável, não mesmo. Por exemplo, quando você passa em frente a uma sala de uma universidade federal e ouve uma conversa assim é de cortar o coração:

— Mas, ô, viagem, é com “gê” ou com “jota”?
— É... Acho que é com “gê”, mas não sei, não. Peraí, vou perguntar ali.
— Deve ser com “jota”. Tipo viajar.
— É com “gêêêê”. — Gritou a mocinha lá do outro lado da sala.

Ai, por Dumbledore. Como assim, “viagem é com ‘gê’ ou com ‘jota’”? Imagina se mandasse escrever “ascensão”? Era capaz de explodir a cabeça. Mas me contive e não falei nada. Nem conhecia as geniais criaturas, não ia atacar estranhos gratuitamente, assim. Meu eu antigo iria, mas eu era uma nova mulher. Muito bem. Talvez não fosse ser tããããão difícil assim isso de ser agradável.

Continuei meu caminho em direção à loja de Fotos, orgulhosa de todo meu controle. Estava indo lá pra buscar umas fotos que eu tinha levado pra imprimir mais cedo naquele mesmo dia. Esperava que ficassem boas, afinal não tinha como errar. Tinha deixado tudo pronto, todas as fotos com as bordas já colocadas, cortadas no tamanho certinho, sem o menor problema. Era só apertar o “print”. Ou foi o que eu imaginei.

— É dezessete e noventa e quatro. — São. São dezessete reais e noventa e quatro centavos!!! Não! Paciência. Preciso. Manter. Autocontrole!

Quando eu abri o envelope, imediatamente tive que fechar, contar até dez (mil) na minha cabeça e respirar fundo. Tinha (aparentemente) me acalmado. Resolvi abrir o envelope de novo. Dei um sorrisinho amarelo, limpei a garganta e tentei controlar minha voz pra não passar nenhuma afetação indignada.

— Er, olha, eu tinha deixado todas as fotografias com borda, já prontas pra imprimir, não precisava mudar nada, tava tudo prontinho. Todas elas vieram impressas sem a mer... quer dizer, a borda. — tentei não fechar a cara pra parecer mais simpática.
— Senhorá, não posso fazer nada.
— Senhora? Senhora?! — Minha voz se elevou uma oitava — Minha filha! Por...xa, olha bem pra minha cara! Vê se eu tô com cara de senhora?! Faz o favor de chamar o cara que me atendeu?
— Não precisa se alterar, senhorá. Mas olhá, ele já foi embora, não vou poder chamar, na-ão...
— Car...acolis! Será que dá pra tu não me chamar de senhora?! — Outra oitava, alguns decibéis.
— É o que que é, hein? — Era um homem que veio se aproximando, possível que fosse o gerente.
— Minhas fotos vieram erradas. E ela fica me chamando de senhora. — Eu falei um pouco mais composta, mas usando um tom de acusação (não tão) sutil.
— Hmmmmm. — Ele pegou a foto da minha mão. — Ó, até dá pra fazer de novo, mas só pra amanhã, mesmo, tá? E, ó, você vai ter que pagar duas vezes, tá? — falou na maior naturalidade, como quem diz que o Superman sabe voar.
— Ah, mas eu não vou pagar de novo. Não mesmo! Mas que mer...leca! Vocês erram e eu que pago? Ah, mas tu ta brincando, né?
— Não, senhora. — Senhora, de novo? Eles tavam procurando, né possível. — A gente teve que arrumar as fotos, né? Pô, tava tudo torto, tudo errado, tudo fora do lugar. Agora tá certo, ó aqui. — começou a subir uma raivinha lá do fundo da alma. — Aliás, essa sua câmera tira umas fotos muito boas, né? Muito massa mesmo.

Aí deu. Foi a gota d’água. Bateu um ódio forte e todas as minhas resoluções de ser uma pessoa melhor foram pras cucuias. Soltei toda minha indignação naquele insolente (e babaca) atendente. E quando descarreguei tudo, meio que perdi o controle sobre meu reprimido vocabulário.

— Aê, mermão, coé a tua?! Cacete, tu tem noção de quanta de merda que tu falou agora? Hein? Porra, tu ta pirado, né cara? Ta doidão, né? Ô sua marmota, como é que tu me diz que as minhas fotos tão erradas? Quem que tu pensa que é pra me dizer que as minhas fotos estão erradas?? — Muitas, muitas oitavas e vários decibéis — E deixa eu te dizer uma coisa, seu mané! Tu diz pruma cozinheira que é a panela dela faz comida boa? Diz? Num diz, né, então tu num vem me dizer que minha câmera tira umas fotos muito boas, seu merda. — No final minha voz tinha subido mais oitavas do que eu achei que fosse possível. Acho que o cara nem escutava mais. Chegou num ponto que só os cachorros escutavam.

Eu deixei os dezessete reais e noventa e quatro centavos no balcão e saí tresloucada da loja. Não deu pra ser uma pessoa legal. Só dá pra ser legal quando as pessoas colaboram, mas se elas são imbecis, ah, aí fica difícil.

domingo, 24 de maio de 2009

Texto meia-boca

Verônica tinha que escrever. Escrever várias páginas sobre um assunto que não a interessava. Desde cedo travava uma batalha intensa contra a Preguiça. Preguiça estava ganhando de 34 a 2. Os dois pontos de Verônica vinham de:
  • tirar o livro da mochila e
  • abrir sites sobre o assunto.
Os 34 pontos de Preguiça vinham de fazer Verônica:
  • assistir aos trailers de Harry Potter 6 (um ponto para cada vez que assistiu qualquer um dos videos, então só aí 19 pontos.);
  • assistir a quatro curtas na internet (um ponto por curta 4 pontos);
  • gravar a si mesma cantando quatro músicas da Noviça Rebelde e duas de Chicago, só pra ter certeza de que não havia mesmo nenhum tipo de esperança pra sua voz terrível (um ponto por música, 6 pontos);
  • dormir ouvindo música por quase duas horas (um ponto por hora, 2 pontos) e
  • ler três revistas da Turma da Mônica (um ponto por revista, 3 pontos).

Verônica fez um acordo com a Preguiça. Ela escreveria algumas páginas, em vez de várias páginas. Preguiça seria bem sucedida pela metade. Verônica teria seu trabalho completo pela metade. Fechado. Selaram o acordo de damas com um café pra espantar Preguiça por um tempo.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Uma irresponsável caneca de café às 23h47 dá nisso

Olha, me julgue, mas eu adoro ABBA. 
De verdade. 
Principalmente quando eu encontro videos tipo esse aí de baixo.
ABBA é assim: quanto mais cafona, melhor.
E arrisco dizer, poucos videos mostram Agnetha, Björn, Benny e Frida tão cafoninhas quanto esse.
Genial, simplesmente genial.

sexta-feira, 8 de maio de 2009

O que eu aprendi por ter amigos que moram longe

Aprendi que é difícil ter amigos vivendo longe.    

Aprendi que o amor vem em inúmeras formas diferentes e que nenhuma delas é influenciada por etnia, religião, cor da pele, nacionalidade, diferenças culturais ou qualquer coisa desse tipo.  

Aprendi que é muito mais difícil se despedir se é você quem está partindo. Mas que mesmo que você esteja ficando, despedidas ainda são uma merda.   

Aprendi que você sente saudades dos seus amigos desde o primeiro momento depois de eles partirem (ou você ir embora) até o milésimo de segundo antes de vê-los novamente   Aprendi que você raramente briga com amigos que moram longe, porque você sempre passa pouco tempo com eles, então não pode perder tempo brigando. 

 Aprendi que sempre tem mil músicas pra te fazer sentir saudades terríveis.  

Aprendi que algumas vezes você sente saudades tão fortes que dói, fisicamente dói.   

Aprendi eu nunca é “adeus”. É sempre “até logo”. Independente que quão logo seja logo.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Fria essa cidade de Brasília

A cidade é planejada, mas a cidade é gelada. Frio o ano inteiro, seja agosto, seja janeiro. Em plenos 15º de latitude sul o frio é mais forte que nos 50º de latitude norte. Não dá pra entender, não consigo imaginar o porquê. O frio polar te bota pra pensar.

Queria saber o que traz esse frio azul pra cidade em que tudo se transforma em alvorada, toda sua branca monumentalidade alaranjada. Os nativos se acostumam com espaços abertos cheios de ar. Talvez seja uma influencia meio subliminar. Cada um é o grupo de si mesmo, gostam de autonomia. Não gostam de ninguém por perto, dá claustrofobia. 

Na Brasília glacial os desavisados se tornam bonecos de neve em potencial. Sem tempo de reagir, se congelam sem nem sentir. Os mais atentos percebem pouco antes de virar picolés do cerrado e lutam bravamente pra manterem-se aquecidos ante o frio desgraçado. Sofrem com a friagem constante, o vento gelado e cortante, cruel, vindo de toda parte, até do exuberante céu. 

Brasília é difícil, inacessível. Tal como sua cidade, os brasilienses são tão acessíveis quanto o topo do Everest ou os becos remotos de Bucareste. 

Sei bem que quase ninguém se sente assim, mas não faz mal, esse era pra ser um monólogo, então resolvi falar de mim. Não sei sobre todo o mundo, melhor não generalizar, mas meu próprio mundo seria melhor se Brasília não fosse uma cidade com corações de clima polar.

 

 

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Porcaria de pedacinho de plástico

É quando a gente tem que empacotar coisas pra fazer uma mudança e começa a tirar tudo dos armários pra socar em caixas e depois em novos armários que encontramos as coisas que misteriosamente desapareceram durante os anos passados ali. Sempre caem por terra as teorias sobre duendes sacanas, gnomos peraltas e assombrações entediadas, que pegam nossas coisas só pra rir da nossa cara depois. 

Verônica tirava pilhas e pilhas de bugigangas e cacarecos do seu armário outro dia. Puxou um pano verde bandeira que de tão desbotado já parecia cinza poeira e descobriu a outra metade, bege-cor-de-areia, mas em outros tempos, de um amarelo-lua-cheia. Era a bandeira da Copa de 70. Não era sua. 

Continuou puxando tralhas até que ouviu o pickity-pick de um pedacinho de plástico que tinha caído no chão de madeira. Olhou pra baixo e viu, ao lado de seus pés calçados em meias listradas, aquela palheta vermelha. 

Era a sua primeira palheta, da época em que tinha estudado guitarra, há 200 anos, antes de parar de tentar se enganar e abandonar logo de uma vez a música. Tinha desistido da guitarra, assim como do teclado um pouco antes, porque não tinha o menor talento. Sua personalidade extremista sempre fez com que o conceito de hobby fosse um pouco turvo pra ela. Suas desistências musicais param por aí, mas segue uma lista grande de outras tentativas frustradas em variados campos. 

Comecemos com esportes. Seu primeiro esporte foi a natação. Começou aos dois anos. Aos 9 foi a 3ª melhor colocada resultado geral anual da sua cidadezinha. Parou de nadar aos 14 porque mudou de cidade. Às vezes ainda sente falta das horas e horas de silêncio na piscina. Até hoje o cheiro de cloro a faz sorrir. 

O futebol, Verônica tentou quando tinha 8 anos. Antes mesmo de completar 9 já tinha parado. Não conseguia administrar as competências de correr e chutar a bola ao mesmo tempo. Um pouco depois começou o tênis, mas dois meses depois de ter começado, teve que parar, porque o professor ia se aposentar. Ótima desculpa pra desistir. 

No handebol sabia que não iria longe, mas está por lá há quase 4 anos. É goleira. A parte que envolve os olhos roxos, gominhos de bola marcados pelo corpo e outros hematomas estranhos não a incomoda tanto assim. Agora parece que tem que parar e isso a rói por dentro, mas não há solução melhor, pelo menos não por um tempo. Teve também uma brevíssima passagem pelo Rugby, abreviada ainda mais por um ombro deslocado. 

Deixando o campo desportivo. Tinha tentado escrever, mas sucessivas notas vermelhas no colégio foram seu argumento, ou melhor, sua desculpa para desistir. Tentou desenho, mas mesmo depois de aulas e mais aulas, até bonequinhos de palito continuam tortos e feiosos. Nunca tentou cantar. Percebeu antes de tentar que não ia a lugar nenhum. Sua suposta voz de contralto só serviria para ser usada como instrumento de tortura avançado, do mesmo nível d’O Motoqueiro Fantasma do Nicolas Cage e de um CD do Kenny G. 

Cacete, é impressionante como aquela bosta de pedacinho de plástico vermelho, inútil ressecado e quebradiço conseguia ser a representação física de todas as coisas que ela tinha tentado, mas fracassado. Era a concretização da sua personalidade extremista, derrotista e comodista. Jogou a palheta no lixo e pensou em continuar a limpeza do armário. Em vez disso foi assistir a um filme e pensar na próxima coisa que poderia começar, pra acabar desistindo depois.

sábado, 2 de maio de 2009

Pensamentos Quase Conexos #1

Porque é que o nome da cor vermelha é parecido em muitas das línguas que derivam do latim, menos em português? Em italiano é rosso, em espanhol, rojo, em francês, rouge. Porque diabos vermelho, então? Rubro é até parecido, mas nem tanto assim. Vou buscar a etimologia da palavra mais tarde.

Etimologia é uma palavra legal, mas sempre tenho vontade de fazer um trocadilho: “De onde vem a palavra inseto? Hmmmmmm, vou fazer a entomologia da palavra!” Ha ha. Ok, a piada besta não foi muito boa mesmo...

Boa mesmo foi a frase na aula de espanhol. As frases, na verdade, porque o divertido termo apareceu em duas sentenças naquela aula. Uma das frases era: Se capturó 21 presuntos subversivos. A outra era Se mató a presunto falsificador. Presunto, em espanhol, significa suspeito, em português. Vem de presumir. Mas fica difícil não pensar em presunto, presunto mesmo, em português.

Na aula de ética falamos sobre o dilema de Heinz. Não consegui não pensar em Heinz, o ketchup. Sabia que o número 57 impresso no rótulo dos ketchups Heinz vem da época do inicio da companhia? Eram 57 variedades de produtos. Na verdade eram mais de 60, mas Heinz achou 57 um número de sorte. Pra quem comprava devia ser um dilema mesmo: como escolher dentre as 57 variedades disponíveis de, sei lá, picles?

Ontem fui comprar picles. Passei no mercado só pra isso. Não tinham57 variedades, mas tinham umas tantas. Tinha picles de pepino, de beterraba, de vegetais variados, de aspargos... Umas duas ou três marcas. Finalmente achei uma marca, a Hemmer, que tem bons picles. Crocantes, mas suculentos.

É ruim quando a gente espera comer um Serenata de Amor crocante e delicioso, mas quando dá uma mordida em vez de fazer croc, ou cruch, ele faz pffff. É decepcionante.

Decepcionante marcar uma viagem, fazer planos e ter que cancelar tudo por causa de uma prova idiota... Dá tristeza. E uma pontinha de culpa.

Vou ter que terminar tudo abruptamente. Minha culpa não ter pensado em como fazer isso quando comecei.