quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Sobre minha própria identidade, sob minha própria identidade

Por um breve momento decidi abandonar a segurança dos alter-egos e dos textos escritos em terceira pessoa no tempo passado.
Percebi que não faz a menor diferença se eu tenho ou não restrições quanto ao que eu escrevo, porque ninguém nunca vai ler, mesmo.
Queria ter alguma coisa poética e/ou bonita pra escrever, mas não tenho. Nunca tive. Escrever sempre foi um probema, mas ultimamente tenho escrito porque é a maneira que eu encontrei de me livrar dos pensamentos que não conseguia externar. 
Tenho me sentido só. Sei que não deveria. Tenho amigos incríveis. O problema é que eu sou neurótica e paranóica e acho que ninguém gosta de mim, que eu sou a quinta roda, é assim mesmo que e diz? Talvez não gostem, talvez sim, não estou dentro da cabeça de ninguém pra saber.
Eu superdimensiono tudo e sofro por antecipação. São dois de meus maiores defeitos.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Samanta era invisível

Samanta era invisível. Achava que isso bom, mas nem sempre. Como tudo nessa vida, tinha mais de um lado naquilo de ser invisível. Não costumava gastar muito tempo pensando sobre o lado bom de ser invisível, até porque ele não a incomodava.
Incomodava era o fato de ninguém nunca se lembrar de a ter conhecido, a visto. Ninguém notava a sua presença. Nunca. Como lembrar de uma coisa invisível?
Às vezes achava que não era invisível para as pessoas que considerava mais próximas dela, mas estava enganada. Na verdade, estava meio certa. Não é que fosse invisível. Para eles, era translúcida. Era vista, mas só em condições especiais e muito particulares. Como notar uma coisa invisível?
O que menos gostava em ser invísivel era que percebia que todos a sua volta eram mais importantes do que ela jamais seria. A invisibilidade trazia a insignificância. Como dar importância a uma coisa invisível?
Ela só queria saber porque era invisível. Nunca conseguiu descobrir. Hoje não se sabe do paradeiro de Samanta. Afinal, como encontrar uma coisa invisível?

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Verônica e os pensamentos espalhados

Verônica estava confusa e não sabia o que dizer, o que fazer, com quem convesar, em quem confiar.
Há um tempo tudo lhe incomodava e soava errado, assim. Mais que de repente tudo se resolveu e seu mundo era perfeito. 
Por motivos desconhecidos seus pensamentos estavam de novo espalhados pela cabeça como as mil peças de um quebra-cabeças atirado do oitavo andar. 
Precisava de elementos específicos, mas quando os conseguia, se irritava. É certo que o problema era com ela. Não tinha motivos, mas estava cada dia se tornando uma pessoa pior. Sentia que irritava todos a sua volta e se irritava também. 
Estava se tornando intolerante. Diferenças de opinião a deixavam incomodada e defensiva.
Talvez seja por causa daquela sua mania infeliz de gostar mais dos outros do que eles gostam dela. E de gostar mais dos outros do que de si mesma.
Tinha que ser menos estúpida, menos intragável, menos insuportável. Podia ser mais doce.

Aos poucos Verônica aprendia a separar as coisas que aconteciam e considerar que as pessoas são diferentes em situações diferentes. Era extremamente tolerante com determinadas coisas, mas talvez porque fosse muito ignorante. "Minha tolerância vem da minha ignorância.", pensou. "Que legal. Ainda rima." Esperava estar certa, mas talvez não.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Penélope a 10000 pés e em velocidade de cruzeiro

Naquele momento Penélope voava. Não gostava de voar. Não porque tivesse medo, mas porque era desconfortável e incômodo.

Tentou dormir uma vez. A passageira da poltrona ao lado, que precisava chegar à sua poltrona, tornou sua tentativa frustrada.

Tentou outra vez, mas o comissário teve que chamar sua atenção porque a porcaria da alça da mochila estava no corredor e não abaixo do assento à sua frente:

- Senhora, a alça da mochila...

- Colega! Senhora?! - Só pensou. Não falou nada. Queria dormir.

Mais uma vez tentou dormir. Antes abaixou para pegar música na mochila. Nesse exato instante a iluminada criatura do banco 4D, em frente ao seu, resolveu reclinar a poltrona. A mesinha se soltou e acertou sua cabeça. Doeu. Logo se recompos e reclinou sua poltrona, torcendo para que acertasse também a cabeça de alguém.

Tentou ainda mais uma vez e dessa vez dormiu. Sua cabeça, no entanto, pendeu para o lado do corredor. Estava começando a sonhar. 

Estava acompanhada de quatro pessoas. Conversavam ao redor de uma mesa, tomavam sorvete de peixe e bebiam suco de laranja em copos do tamanho de baldes. Sonhos são estranhos. Nunca soube onde aquele a levaria. 

Alguém com educação pequena e uma bolsa grande passou pelo corredor e acertou sua testa. Em cheio. Penélope acordou atordoada.

O carrinho com "lanche" já passava. Estava já na fileira 3.

- Pepsi, guaraná, suco de laranja, pêssego ou goiaba light? Barrinha de coco, castanha ou frutas?

- Não tem comida? - De novo, só pensou.

O cheiro de guaraná invadia a cabine, mas mesmo assim pediu Pepsi. Era contra suas regras "tomar refrigerante antes do meio dia e/ou em dias de semana", mas naquele momento, às 8h45 da manhã de quinta-feira, isso não era importante.

Desistiu de dormir, encheu a cara de refrigerante e foi escrever.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Restos de uma depressão-de-aniversário

O tempo assusta. A passagem do tempo é ameaçadora. A maneira como as coisas são transitórias incomoda. O presente é estranho e indefinido. O passado existe. O futuro existe. O presente não passa de um conceito, uma convenção. 
Não gosto do tempo. Ele muda as pessoas. Amigos viram estranhos. Estranhos se tornam os novos amigos, para serem futuros estranhos.
As pessoas vão embora e a saudade dói. Elas não se importam. 
Bom, talvez se importem. 

Orson Welles uma vez disse: "We're born alone, we live alone, we die alone. Only through our love and friendship can we create the illusion for the moment that we're not alone."

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Primeira Chuva

Esquece a primeira chuva que cai. Essa não é realmente a primeira.
A chuva inaugural é a primeira a te pegar sem previsão, sem guarda chuva,  sem ter pra onde ir.
Ah! Você se molha. Da cabeça aos pés. Toda a roupa encharcada, os sapatos que fazem sblosh, sblosh. Vem aquela vontade de tentar ser Gene Kelly, cantar e dançar. 
Gloriosa sensação! Depois de um julho seco, um agosto muito seco, um setembro esturricado e um outubro que parecia promissor, mas foi tão seco quanto os meses anteriores, eis que chega o mês de novembro trazendo a chuva! 
Talvez seja a única vez que ser pego pela chuva não cause um ódio mortal. Pelo contrário. Parece cafona dizer, mas lava a alma. Tira aquela poeira laranja que já começava a pesar, tira o rancor guardado durante os meses secos. 

Acho que a partir de agora seria interessante que eu comprasse um guarda-chuva novo. Só é legal se molhar assim uma vez, mesmo.